A decisão foi publicada nesta sexta (11) no Diário Oficial do município. Por meio do seu advogado, ele rebateu as denúncias
Do G1 PE
Foto: Reprodução/Instagram
Após denúncia de transfobia feita pela primeira e única mulher trans na Guarda Municipal de Jaboatão dos Guararapes, o inspetor Admilson Silva de Freitas, de 59 anos, comandante da corporação, foi dispensado do cargo pelo prefeito Anderson Ferreira (PR). A decisão foi publicada nesta sexta (11) no Diário Oficial do município. Por meio do seu advogado, ele rebateu as denúncias.
O crime de transfobia ocorre quando há preconceito contra quem se identifica como transgênero. Integrante da Guarda Municipal há cinco anos, Abby Silva Moreira, de 45 anos, contou ao g1 que era tratada pelo ex-comandante pelo pronome masculino, apesar de se identificar como mulher transgênero, e que foi afastada corporação por ele, mesmo sendo concursada.
Abby também disse que teve suas gratificações salariais cortadas por Admilson Silva de Freitas. Nesta sexta, a servidora comentou a decisão do executivo municipal e disse que espera que o caso sirva de exemplo para que quem integra a população LGBTQIA+ tenha coragem de denunciar qualquer preconceito.
Segundo Abby, o sentimento dela é de justiça, mas não é possível comemorar. "Me sinto triste porque nada disso era necessário. Bastava me respeitar. É tão simples, mas tão complicado para tantos", afirmou.
Na publicação, o prefeito também determina que o inspetor Cláudio José de Andrade assuma o cargo no lugar de Admilson.
Por nota, a prefeitura de Jaboatão informou que alterou a lotação da servidora e que, a partir desta sexta-feira (11), ela passa a integrar o quadro de funcionários da Secretaria-executiva de Direitos Humanos, no setor administrativo, durante período de readaptação.
Na semana passada, uma denúncia formal por transfobia foi feita à corporação por meio do Sindicato dos Guardas Municipais de Jaboatão. Na segunda (7), o sindicado protocolou uma denúncia no Ministério Público de Pernambuco (MPPE).
De acordo com a 6ª Promotoria de Justiça de Defesa da Cidadania de Jaboatão dos Guararapes, já foi instaurado um procedimento.
O MPPE também disse que, como medida preliminar, foi marcada, para a primeira semana de março, uma audiência entre a vítima, o agressor, o Conselho LGBTQI+, a Secretaria de Direitos Humanos e o Sindicato dos Guardas Municipais de Jaboatão dos Guararapes.
Outro lado
O advogado Emerson Beltrão, representante do inspetor Admilson Silva de Freitas, nega que ele tenha sido transfóbico. Ele também disse que, apesar das denúncias, a servidora não provou o que disse.
"Todas as vezes em que ela se encontrou com o comandante, estavam na presença de outras pessoas. A sala do comandante não fica fechada só com ele. Outros guardas circulam e trabalham. Em nenhum momento ele chamou ela pelo pronome masculino. Jamais desrespeitou ela de alguma forma. Não houve qualquer tipo de desrespeito, qualquer tipo de humilhação", afirmou.
De acordo com o advogado, as gratificações de Abby foram retiradas pelo ex-comandante porque ela não exercia mais a função que justificava o recebimento delas.
"Ela já não fazia jus desde abril e 2021, quando ela deixou de fazer parte de um grupamento operacional e passou a fazer parte de outra regional, que de acordo com as leis municipais não fazia jus a essas gratificações. Em janeiro agora ela foi reclamar com o comandante e ele falou para ela que ela não faz jus às gratificações desde abril", destacou.
A defesa do inspetor Admilson afirma que ele se sente injustiçado com as denúncias feitas pela servidora e com a exoneração do cargo.
"É um homem com mais de 25 anos de serviço, que nunca deu margem a qualquer tipo de mácula nas suas atribuições, que tem família, que tem um nome a zelar. Ele estava mudando, fazendo um excelente trabalho na Guarda Municipal. E está sendo bode expiatório de uma disputa do sindicato com a guarda", disse.
Emerson Beltrão afirmou que serão tomadas medidas legais contra a servidora e contra o Sindicato dos Guardas Municipais de Jaboatão.
"A gente já está acompanhando, está de posse dos autos e a gente vai tomar todas as medidas cabíveis, não só contra a servidora, mas também contra o sindicado específico, do qual o presidente está se apropriando de uma pauta que tem uma legitimidade para se beneficiar politicamente", frisou.
O advogado também nega que o ex-comandante tenha "descartado" a servidora da função. Ele explica que a transferência de Abby da Guarda Municipal para a secretaria de Direitos Humanos do município foi feita por solicitação médica, já que a servidora faz tratamento psiquiátrico e o médico solicitou sua "veementemente requalificação funcional para otimizar o tratamento".
"Não era questão de não ter lugar, existiam três laudos dizendo que ela não tinha condições de exercer a função naquele momento. O comandante quis proteger o bem estar físico e emocional dela", afirmou.
Para Emerson, a servidora queria direitos pela condição de gênero dela. "Ela se achava no direito de ter mais direitos de outras pessoas, ganhar gratificações sem fazer jus, sem ter o direito. E na realidade o comandante simplesmente disse: eu tenho que agir dentro da legalidade", disse.
Entenda o caso
Primeira mulher trans concursada em uma Guarda Civil Municipal do país, Abby Silva Moreira passou no concurso em 2014 e assumiu o cargo em 2017. Ela afirma que sofre transfobia desde que entrou na corporação, mas que tudo foi intensificado no último ano, quando o inspetor Admilson Silva de Freitas assumiu o comando.
De acordo com Abby, a primeira providência do comandante foi retirar as gratificações dela sem qualquer justificativa. A junta médica do município solicitou a readequação dela para uma área administrativa da Guarda Municipal. Foi quando Admilson de Freitas a afastou, segundo Abby.
"Quando saiu uma portaria no Diário Oficial, em vez de me readaptar na Guarda, ele falou que não tinha lugar para mim lá e me jogou para outra secretaria. Lá não tinha trabalho para mim e me mandaram de volta para a Guarda. Voltei, e ele disse que eu não tinha mais nada a ver com a Guarda e me expulsou, como se eu tivesse sido exonerada de um cargo que sou concursada", contou, na quinta (10).
Ainda de acordo com Abby, este foi o principal de uma série de episódios que fizeram com que ela se sentisse desrespeitada. A servidora está afastada por determinação médica até março.
A servidora acredita que isso não teria acontecido se ela fosse uma mulher cisgênero, ou seja, que nasceu com sexo biológico feminino e se identifica como mulher.
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